Sábado, 3 de Maio de 2008
O tango Inacabado - IV

    

“ Quereme asi, piantao, piantao, piantao...
Trepate a esa ternura de locos que hay en mi (...)

 

¡Loco él y loca yo!
¡Locos! ¡Locos! ¡Locos!

   

  

  

 

      (...)

 

      Sustêm o momento um pouco mais, cientes do capricho de pouca dura, mas ainda embriagados pelo grave contrabaixo que para eles toca sem que o quarteto de cordas seja afagado pela crina do curvo arco ou pinçado pelos dedos do erecto músico. O abraço afrouxa, os corpos apaziguam-se deixando, com um involuntário suspiro de decepção, que voltem a ser dois seres. A pulsação abranda, a respiração normaliza-se, os olhos perdem o fulgor. Deixam de ser um só corpo, companheiros na dança, amantes na pista. O tango realmente acaba e sob o pavimento de tacos riscados, separam-se dois perfeitos estranhos.
 
      Os primeiros tímidos sons do acordionista chegam dum banco de madeira que mal sustenta o volumoso músico que abraça o fole e acaricia o teclado. Os pares que se encaminham para a pista fazem ecoar a sua própria cadência no soalho, tacos de sapato contra tacos de madeira. O ciclo recomeça, contudo a dança não se repete, o par não se volta a unir, o momento passara, o tango acabara sem promessa de se seguir outro.

      O tempo ficara, porém, suspenso momentos atrás, indelével no fulgor da dança. A um canto duma loja qualquer, numa outra capital do outro lado do Atlântico, dois corpos carnalmente unidos dançam num só, numa pista  de tela envelhecida, num prostíbulo dos obscuros barrios do norte de Buenos Aires, sob uma luz amarelada traçada a óleo, com a eternidade para a dança e uma moldura de negreiro envernizado onde, em cada veio, ecoam as reminiscências dum tango que outrora ficou por acabar.

 

 

 

                              by Sophia

 

música:  Balada para un loco - Astor Piazzola

 (http://youtube.com/watch?v=v1iI3tqYazw&feature=related) (recitado)

 (http://youtube.com/watch?v=pkJVkQOKCPw) (instrumental) 

 



publicado por **** às 19:18
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5 comentários:
De V.A.D. a 4 de Maio de 2008 às 02:57
Não consegui conter uma interjeição de decepção... Devia ter suspeitado: o tango ficou mesmo por acabar, a união carnal não passando de uma promessa insinuada que ficou por cumprir...

Excelente, a forma como, ao longo dos capítulos, foste aguçando a curiosidade, num crescendo que terminou num anti-clímax anunciado... Muitíssimo interessante, a forma como elaboraste o desfecho da história, a dança eternizada numa tela, o tempo suspenso nos traços a óleo...

Amiga, desejo-te uma óptima noite e um excelente domingo!

Um beijo e um enormeeeeeeeeeeee sorriso... :-)



De aspalavrasnuncatedirei a 14 de Julho de 2008 às 03:45
Olá, vim deixar-te um presente.
http://aspalavrasnuncatedirei.blogs.sapo.pt/


De Bruno a 22 de Setembro de 2008 às 10:38
Excelente o texto...

Excelente a dança...

Excelente os momentos de imaginação....

Parabéns!!!


De Bruno Ervedosa a 21 de Dezembro de 2008 às 07:29
Já tinha comentado uma vez, agora comento novamente.
Todos dançamos na vida. Seguimos os nossos tangos diariamente. Todos eles num compasso ternário.
Por vezes, mudamos de par e deixamos as danças inacabadas.
Mas o importante, é nunca deixar o ritmo que marca a passada, porque quando isso acontecer... passamos a ser meros observantes.


De **** a 8 de Fevereiro de 2009 às 20:56
"Por vezes, mudamos de par e deixamos as danças inacabadas." - por vezes, a dança inebria-nos e, no meio dum passo, quase perdemos o equilíbrio; por vezes, esquecemos a sala que nos rodeia e, no calor da dança, andamos aos outros pares; por vezes, estamos a gostar demais e, no encanto da dança, fingimos que acreditamos que é eterna ...

Realmente o importante é guardar na memória os sorrisos que nos trouxe cada milonga, e, como disseste: "nunca deixar o ritmo que marca a passada".

Muitos tangos, meu amigo...

Beijos,
Sophia

(Ps - Não disse nada antes pk há muito tempo que não venho ao blog... só hoje me deu um ataque de nostalgia e decidi reler algumas coisinhas
foi uma surpresa agradável o teu comentário )


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